domingo, 6 de março de 2016

Oferta e procura

Surpresa nenhuma o mercado ter festejado tanto a ação da Polícia Federal que conduziu coercitiva e pirotecnicamente o ex-presidente Lula a um mero depoimento. O dólar caiu, a bolsa subiu e a alcateia do capital comemorou o pregão bem-sucedido consumindo um tríplex inteiro de champanhe numa praia em Paraty.

Sinais dessa alegria toda dos grandes investidores já tinham sido sentidos com a prisão preventiva do publicitário João Santana (vulgo marqueteiro do PT) e a suposta delação do senador Delcídio do Amaral (que teria acusado Lula e Dilma de interferir nas investigações da operação Lava-Jato).

Tudo muito sintomático.

É imensa a chance de o alinhamento quase mágico desses episódios inflar as manifestações a favor do impeachment da presidenta, e ajudar o tal mercado a se livrar mais cedo de um governo que, embora não cumpra nem de longe (para alívio dos donos do dinheiro) a guinada à esquerda prometida no último pleito, titubeia em pautas como a reforma da Previdência e a flexibilização da legislação trabalhista – medidas que prejudicam os de menor renda, mas que, segundo os lobistas da elite econômica, seriam imprescindíveis para estancar a crise.

Não é difícil imaginar a ansiedade desses lobistas diante da possibilidade do fim prematuro do mandato de uma presidenta cujo partido ainda mantém uma ala dita radical, que (dizem) “sabota” sua governabilidade ao defender uma agenda mais progressista: “populismos” como a taxação de grandes fortunas, a tributação de lucros e dividendos, a defesa e ampliação de programas sociais, o fim das doações de empresas a campanhas eleitorais, entre outros temas repletos de “ideologia” e causadores de ojeriza em qualquer megacorporação que se preze.

Também não é difícil imaginar a ovulação dos gerentes da desigualdade social frente à oportunidade de ver aquele ex-sindicalista (que contribuiu para a saída de milhões de brasileiros da pobreza extrema) simbolicamente morto e enterrado. O simples aceno daqueles quatro dedos a uma nova candidatura à presidência é pesadelo de onze entre dez políticos conservadores – muitos dos quais sócios minoritários e embaixadores majoritários dos faraós da pirâmide social.

Os acionistas do caos, no entanto, não deveriam se angustiar tanto com as projeções em curto e médio prazo. Está a favor deles a disposição – justa, se não fosse seletiva – de certos juízes em investigar e da mídia corporativa em noticiar das pedaladas da Dilma aos pedalinhos do Lula. Mais: está a favor deles o desinteresse cúmplice dessas mesmas esferas em relação a personagens que se comprometem com multinacionais do petróleo a defender mudanças na lei de partilha do pré-sal; ou que se unem a cartéis internacionais para fraudar licitações de trens e metrôs; ou, ainda, que se associam a determinados grupos para salvar milhões em paraísos fiscais a título de honorários por facilitar privatizações.

A procura por um gestor de suas causas sempre mui humanitárias, agora ou em 2018, não há de ser árdua; vide a oferta de candidatos dispostos a representar – sem pudor algum  o sistema financeiro.

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