quinta-feira, 19 de abril de 2012

Casa vazia

Passava por ela todo dia depois do trabalho. Tinha teto, tinha chão, tinha parede. Mas não tinha nada. A não ser as janelas tristes, o portão carrancudo, a fachada decadentemente aristocrática, a varanda carcomida, o quintal melancólico e – o que mais me seduzia – a atmosfera de mistério abandonado, de enigma esquecido pelo tempo.

A casa era guardada por três cães brancos, de olhos quase vivos, atentos a cada movimento da rua. A cada ventania disfarçada de brisa.

Eles sabiam quem eu era. Sabiam que eu passava por ali todo finzinho de tarde. Sabiam que eu parava uns bons minutos diante do palacete não apenas para admirá-lo – mas para desvendá-lo. Sabiam que eu não sossegaria enquanto não descobrisse o que tanto vigiavam, o que protegiam, o que escondiam, o que defendiam.

Talvez o Santo Graal.

Ou o tesouro do temido Willy Caolho. A joia do Nilo. O precioso Anel de Sauron. A Flor das Sete Cores. O mapa das minas do rei Salomão. A arca perdida. O elo perdido. O stargate. As horcruxes. Um carregamento clandestino de chocolate Wonka. O labirinto do Fauno. A estrada de tijolos amarelos. O buraco do coelho.

Não importava. A graça estava justamente em não saber. Em não sossegar. Em não descobrir. Em admirar sem ter que desvendar. Em passar por aquela casa todo dia depois do trabalho. Em parar uns bons minutos diante dela. Em me disfarçar de brisa – e ser atentamente observado por aqueles três cães brancos, de olhos quase vivos.

2 comentários:

  1. Que texto lindo!
    Não creio que é seu :O
    Adoreeei *-*

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  2. Juro que a primeira coisa que me veio à cabeça quando vi a casa foi a muy nobre e antiga mansão da família Black. Haha.

    :*

    http://hey-london.net

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