domingo, 19 de fevereiro de 2012

Como estamos bandidos

A matéria especial do Superfantástico do último domingo chamou minha atenção: manobristas portadores da raríssima síndrome de Metralha foram flagrados por câmeras escondidas e pra lá de abelhudas roubando doces e moedas dos carros que guardavam. E eu que achava que essas criaturas não existiam de se pegar...

Pois chamou ainda mais minha atenção um amigo (cujo nome não vou revelar) indignado com os faustões e gugus que arquitetaram tal armadilha − digna de pegadinha do Malandro − só para, segundo ele, expor os rostos de profissionais que tinham apenas tomado emprestado chocolates e trocados quase oferecidos a eles. Que puxa. Oh vida, oh azar. Criaram um cenário de novela mexicana para induzir os pobres coitados ao erro e denegrir a imagem de uma categoria inteira. Um abuso da imprensa sensacionalista.

Subi nas tamancas: abuso é alguém tomar o que é seu, ainda que sejam doces ou moedas. Aqui em Sucupira City a desonestidade parece brotar com mais facilidade que o respeito ao próximo, que a cidadania: é o manobrista que rouba um brigadeiro, é o dono do posto que surrupia dois litros de gasolina por automóvel, é o prefeito Odorico que aumenta o próprio salário em 126%. Os flagrantes, mesmo os sensacionalistas, talvez sejam um mal necessário. Antes eles, antes até uma democracia sucupirense, que leis de imprensa, mordaças, vendas, silêncio.

Meu amigo, claro, não se conformou: quer dizer então que a mídia não precisa de limites, de um Big Brother Boninho a vigiá-la?

Não troque de canal, Juvenal (ops! me escapuliu!). O fato é que alguns manobristas − felizmente a minoria − se apropriaram de algo que não lhes pertencia. Aqueles doces e moedas não foram oferecidos a eles. Esses "profissionais" não são coitadinhos nem vítimas, muito menos ministros da Dilma. Ou será coitadinha, vítima a Edileuza, faxineira lá de casa que não resistiu à tentação de pegar uns biscoitinhos, umas carambolas e até umas joinhas de mamãe "oferecidas" a ela?

Ok, ok, é importante dizer que o problema existe. Mas por que tanta pirotecnia? Isto aqui, ôô, não é um filme de Michael Bay, iáiá. Não estamos em Hollywood. Será mesmo imprescindível estigmatizar publicamente um reles pai de família cujo maior crime talvez tenha sido esse, roubar docinhos e moedinhas? Não seria suficiente o patrão dele ou o Bope repreendê-lo com o saco? Por que partir logo para o cabo de vassoura?

Um dos nossos grandes males é justamente esse, Ju: achar que atitudes como "roubar docinhos" ou "aceitar propinazinhas" sejam um problema menor e, portanto, não mereçam estar no palco do Caldeirão ou no sofá da Hebe. O tamanho ou a quantidade do roubo não importa; importa, sim, o prazer, digo, o ato de roubar. A honestidade não é quantificável.

Então o Dick Manobrista merece a mesmíssima punição do Sr. Mutley − que desvia malas de dinheiro público destinado à nossa falta de educação. Como não há medidas de honestidade ou desonestidade, coloquemos mamãe, papai, vovó, cachorro, papagaio mais a barata da vizinha no mesmo reality show e arranquemos as mãos de todos. Não vai sobrar unzinho no paredão.

De fato, o princípio da honestidade − e aqui estou falando em termos morais, filosóficos, diogo-mainárdicos até − não é quantificável, o que não significa que o ato desonesto, em termos legais, não seja. É evidente que a punição deve ser proporcional ao crime. Um docinho roubado pode custar uma unha, quiçá um dedo; malas de dinheiro, talvez um braço.

Juvenal arregalou os olhos, escondeu as mãos nos bolsos e não saiu de fininho. Fugiu de jatinho. Nunca mais ouvi falar dele.

E eu fiquei (quase) sozinho. Só me restaram as pombas arrulhando, a praça vazia e duas ou três dúvidas: em que mundo da lua meu amigo vivia? Brasília? Ou em algum outro planetinha, de uma galáxia muito, muito distante, onde todo cidadão de bem tinha o sagrado direito ao seu quinhão de roubo, grande ou pequeno, proporcional à distância que o braço conseguisse alcançar?

Honestamente? O velho Juve andava muito bandido.

4 comentários:

  1. Otimo blog!
    PArabéns!

    Depois passa, segui, comenta meu blog!
    se for possivel!

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  2. ótimo texto

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  3. LEGAL, ACHEI MUITO LEGAL,PARABÉNS AMIGO!!

    EUMACLE POESIAS!!
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  4. eu já umaginava qie isso pudesse acontecer , jamais deixaria qualquer coisa dentro do carro
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