domingo, 13 de janeiro de 2013

Impressionismos

Esta é uma história real. Mas haverá quem não acredite nela e diga que se trata apenas de uma história inspirada em fatos redundantemente reais. Uma estória sem aquele agá de high-definition. Encaremos assim: a história ou estória a seguir é como uma pintura de Monet – a certa distância, até parece com o que costumamos chamar de verdade.

No começo de tudo, só havia Amelinha e seus olhos gulosos de ver a coleção de obras impressionistas – Manet, Menet, Minet, Monet, Munet... – que tinha acabado de desembarcar na cidade. Pouco depois do começo, o esforço que fez para convencer o pai a deixar o baú de fotos antigas (que não cansava de limpar e organizar) e acompanhá-la até a exposição.

Pois Seu Rafael só deu o tão esperado sim quando ela aceitou duas condições. A primeira era razoável: a de que o levasse até o restaurante francês mais caro dos arredores para saborear um ratatouille. A segunda, nem tanto: a de que seu anão de jardim e estimação pudesse ir junto. O pequeno precisava sair do quintal, flanar as ruas, respirar novidades, ora bolas!

Pegaram o trem na porta de casa e voilà – saltaram na estação de Montmartre. Atravessaram o boulevard distraidamente apressados e chegaram ao museu no início da manhã. Foi aí que começou o fim. A fila para entrar ia até o início da noite: preta. As pessoas suavam o laranja do solão. Os ambulantes gritavam o vermelho das lembrancinhas. Os carros espalhavam o cinza-grafite no ar. Os pombos pincelavam verdinhos nos desavisados. Argh.

Pelo menos as horas e horas de calçada não foram em vão. No final do arco-íris, a filha do Seu Rafael encontrou o desejado pote de ouro: a Torre Eiffel levemente embaçada (ou nítida enfim); a ponte sobre um lago com gosto de néctar; a moça na calçada à espera... do noivo, do marido, do amante, vai saber; o rapaz de olhar curioso, contemplativo, esnobe, perdido, indecifrável; as meninas no piano dedilhando uma canção de ninar; e – a paixão de Amelinha desde a primeira vez – o garoto tocando flauta. Ela jurava que um dia se casaria com ele.

Mas... E o pote de ouro do pai? O ratatouille? Venceu. Já era tarde demais quando deram de cara com o restaurante francês mais caro dos arredores. Fechado.

Amelinha quase perdeu o rosa das bochechas. Quase desmaiou ao perceber o velho azulando. Só não perdeu nem desmaiou porque ele tratou de abrir um sorriso amarelo e lhe dizer que, mesmo sem ratatouille, o anão estava contente. Tão contente que, se fosse uma pintura de Monet, mandaria emoldurá-lo. Apenas para guardar – no seu baú de fotos antigas – aquela expressão.

Que no fim de tudo, a certa distância, até parecia com o que costumava chamar de felicidade.

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