domingo, 6 de maio de 2012

Encantados

Uma amiga já tinha me avisado: você não vai comer quase nada na sua festa de casamento. Dito e feito: estava eu tão disposto a me a-ca-bar na pista de dança, que mal vi docinhos e canapés. Sorte minha que a Fernanda – a fada com bochechas de princesa que o Cupido flechou no meu caminho – sabiamente resolveu congelar alguns quitutes.

Cá entre nós, eu não acreditava que, após meses de inverno rigoroso no freezer aqui de casa, as gostosuras continuassem vivamente saborosas. Engano meu. O bombom continuava com aquele aroma de cappuccino feito na hora. O beijinho de coco continuava doce, doce. A trufa de nozes continuava surpreendentemente... trufa de nozes.

Como se um feitiço trouxesse novamente à vida cada uma daquelas delicinhas.

Seria bom também – incrível, fantástico, extraordinário, eu diria – se pudéssemos fazer o mesmo com nossos corpitchos: hibernar por umas semanas, meses, anos, décadas, o século necessário, e acordar tão vivamente saborosos quanto no instante do congelamento. Com o mesmo aroma, a mesma doçura, a mesma imagem no espelho. É nozes!

Assim, poderíamos esperar sossegadamente – sem perder um segundo de juventude – até que a novela chata chegasse ao último capítulo; que o filme tão aguardado estreasse; que a modinha do sertanejo universitário passasse; que o Faustão e similares se aposentassem; que o Mano (ou o treinador da vez) escalasse uma seleção digna da Seleção.

Que todo trenzito do metrô fosse confortável; que toda favela fosse urbanizada; que toda escola fosse respeitada; que todo hospital fosse bem equipado; que todo ladrão fosse preso; que toda licitação fosse honesta; que toda cota racial fosse dispensável; que todo preconceito virasse uma lenda distante; que toda desigualdade social fosse extinta.

Que o Brasil fosse um país sério.

Pensando bem, talvez não seja uma ideia tão incrível, fantástica, extraordinária ficar tanto tempo na geladeira. Vai que o mundo termina e a luz apaga. Periga nossos sonhos derreterem.

2 comentários:

  1. Precisamos fazer de nossos sonhos doces... e jamais deixar que sejam congelados...

    ResponderExcluir
  2. Adorei a comparação! Embora o último parágrafo "mate a charada": talvez a vida perca a autencidade... o sangue quente que corre pelas veias!

    ResponderExcluir