domingo, 11 de agosto de 2013

Amarildos

Dias melhores aqueles em que o meme do momento era a Luiza, que todos sabiam estar – muito bem, aliás – no Canadá. Hoje, infelizmente, o hit é outro, cadê o Amarildo, sujeito que a câmera da UPP (oh!) não viu e o GPS da polícia (oh!) não rastreou; pedreiro que, ironicamente, virou pedra no sapato das otoridades.

Pena que esse Amarildo, especialmente para sua família, não deva mais aparecer, a não ser o frio, triste e (não) tão repentino corpo, que a qualquer minuto há de surgir por aí – na voz aveludada de um samurai do horário nobre ou no celular pré-pago de um ninja de última hora – descansando sob a bênção de urubus tripulados.

Mas ainda há outros tantos Amarildos que podem e devem ser encontrados, que podem e devem ser resgatados da cela em que foram esquecidos – quando não abandonados –, graças à cegueira seletiva, ao silêncio conveniente, à negligência fácil, à cumplicidade cínica de cada um de nós.

O Amarildo que sumiu no banco da escola, chegando ao fim da adolescência mal sabendo ler e escrever; o Amarildo que sumiu na fila do hospital aguardando senha, e ainda voltou para casa sem número e atendimento; o Amarildo que sumiu no vagão do trem ou metrô superlotado e virou sardinha nas estatísticas; o Amarildo que sumiu na poeira do sertão à espera de milagre ou água encanada para irrigar sua lavoura; o Amarildo que sumiu sob o viaduto enquanto era tragado pelo crack; o Amarildo que sumiu na calçada, na esquina, no sinal quando nos desviamos dele ou fechamos o vidro do carro; os Amarildos que...

... continuam sumindo diariamente, escorrendo pelos ralos da indiferença – sob nossos narizes de silicone, anestesiados de tanto botox midiático – até virarem apenas números nos ibopes e nas eleições, quando recebem um indulto para escolher o próximo carcereiro e festejar a democracia.

Estão todos aí, perambulando de cova em cova feito walking deads, como que cemitérios ambulantes de restos mortais, mausoléus destituídos de passado e futuro, cadáveres cujo perfume muitas vezes não sentimos porque nosso olfato só sai de casa de helicóptero.

Verdade seja dita: não é difícil encontrá-los. Basta ligarmos a câmera e o GPS do smartphone que carregamos – diz o clichê – do lado esquerdo do peito.

3 comentários:

  1. Assunto bem pertinente Fábio. A indiferença gritas nas ruas, hospitais, escolas e na vizinhança. Parabéns por seu projeto , muito propício o espaço e bastante acolhedor . Acabo de me tornar seu seguidor.Se puder também me dar uma força curtindo minha fan page, aqui está:

    Fan Page: https://www.facebook.com/oivalfnocinema
    www.cineprise.com.br

    Muito obrigado e novamente meus parabéns!!!

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  2. As vezes nós mesmos podemos ser o Amarildo ;)

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  3. As coisas quando parecem que vão mudar dão sinais de que não sairão da inércia

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