Parece
maldade pedir ao trabalhador que acorde cedo no seu dia, ainda mais quando o
feriado cai num domingo. Mas não é maldade – é metáfora. A ideia aqui não é
intimá-lo a deixar a cama antes que o sol bata ponto no horizonte. É querer que
ele finalmente desperte do sonho que o faz acreditar na riqueza e na
prosperidade como destinos inevitáveis de uma vida dedicada às
horas extras.
Não
tem ajuda divina para quem cedo madruga; o que tem é slogan usado por patrões
que desejam a qualquer custo (menos o deles, claro) aumentar a produtividade e
o lucro.
Um
bom exemplo disso são os Estados Unidos. Não bastasse grande parte dos
trabalhadores de lá mal ganhar quinze dólares por hora e jamais ter ouvido
falar em décimo terceiro, férias remuneradas, fundo de garantia e afins (que
não existem por aquelas bandas), os mui bem pagos CEOs ainda inventam um tal just-in-time-schedulling, última tendência
em flexibilização do trabalho: o funcionário liga ou manda uma mensagem para o
chefe no comecinho da manhã perguntando se precisará dele naquele dia; caso a
resposta seja negativa, o sujeito fica em casa – sem receber.
Pouco
importa que o camarada tenha seus gastos inadiáveis com o aluguel do apê ou a
hipoteca da casa, com o plano de saúde ou a conta de luz. Pouco importa que não
tenha mais um salário certo no fim da semana, do mês, do ano. Pouco importa que
não possa programar a própria vida. O que importa é que a empresa tenha se
livrado daquela despesa fixa e possa faturar ainda mais.
É
ou não a terra das oportunidades... para as corporações?
Corta
para o Brasil – que também virou terra das oportunidades depois que uma crise econômica
ergueu a ponte ideal para um futuro distópico. Afastada a presidenta que vacila
na reforma da Previdência ou na terceirização do mercado de trabalho (e dizimado
o governo que reduziu desigualdades seculares ao diminuir significativamente a
pobreza extrema e aumentar consideravelmente o salário mínimo), assume o grupo político
que, patrocinado pela elite fiespiana, vê no caos a chance de aprovar leis que
só a beneficiam – tudo sob o álibi da recuperação da economia.
Duas
dessas leis já tramitam no Regresso (vulgo Congresso): a primeira reconhece a
contratação de prestadoras de serviços para executarem as chamadas atividades-fim
(ou seja, uma clínica que queira lipoaspirar encargos trabalhistas e
previdenciários para siliconar sua margem de lucro poderá contar com médicos
terceirizados); já a segunda lei permite que acordos coletivos entre patrões e
empregados se sobreponham à CLT, ainda que isso signifique perdas para os
trabalhadores.
Como
o que é ruim pode piorar, a facção prestes a tomar o poder planeja ainda aprofundar
o famigerado ajuste fiscal. Sendo seus financiadores os patos que (não) são, é
óbvio que esse ajuste vai nadar bem longe da taxação de grandes fortunas, do combate
rigoroso à sonegação de impostos e de uma reforma tributária afeita à
desconcentração de renda. O mergulho há de ser na parte mais funda do lago,
onde boiam os peixes pequenos.
Daí
a intenção de – sob o pretexto de flexibilizar o orçamento – acabar com os investimentos
obrigatórios, estabelecidos em lei, relativos à saúde e à educação; afinal,
quem precisa de hospitais e escolas gratuitos e de qualidade, senão os mais
pobres? Daí a proposta de – sob a alegação de reequilibrar as contas públicas –
desvincular benefícios da Previdência dos reajustes concedidos ao salário
mínimo; assim aposentados, por exemplo, passariam a ter apenas a
reposição da inflação.
Medidas
amargas mas necessárias – repete diariamente a mídia corporativa, sempre disposta
a defender os interesses de seus anunciantes.
É
por tudo isso que o cidadão ainda anestesiado pelo ódio a um partido – bela adormecida
aparentemente imune a qualquer selinho de esclarecimento – tem de acordar o
mais rápido possível desse pesadelo capaz de reunir impeachment e esperança
sobre o mesmo colchão. É urgente que ele largue todos os travesseiros estofados
de ingenuidade e lute por seus direitos. Antes que o retrocesso e a viagem ao
passado sejam tão radicais, que o país volte a se chamar Estados Unidos.
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