Não
sei o que é pior: a extinção (temporária) do Ministério da Cultura – algo tão
simbolicamente desastroso quanto um ministério formado apenas por homens
brancos em pleno século 21 – ou as pessoas defendendo o fim da pasta com a
justificativa de que o momento é de crise e, portanto, as prioridades devem ser
o emprego, a saúde e a educação.
Como
se a cultura – aqui sinônimo de arte – fosse um pudim do qual se pode abrir mão
para garantir o feijão com arroz. Visãozinha mais tacanha essa.
Cultura
É emprego, minha gente. Deem um google na vida e vão descobrir que, entre 2003 e
2010, nossa produção cinematográfica saltou de seis para 150 filmes por ano. Vão
calcular quantos empregos diretos e indiretos foram gerados com esse
crescimento. Ou com o boom das peças musicais na última década. Ou com o ressurgimento
do carnaval de rua (graças aos inúmeros blocos criados) em cidades como o Rio
de Janeiro.
Já
passou o tempo em que o foco dos governos era só indústria siderúrgica ou
metalúrgica. Nos países mais avançados, a indústria cultural é segmento
estratégico, fundamental para o desenvolvimento – inclusive econômico – do
Estado. Não fosse assim, os Estados Unidos renunciariam aos dividendos não somente
financeiros que lhes rende Hollywood ou mesmo a Broadway.
Mas
e os que sofrem nas filas dos hospitais sem atendimento? – pergunta quem
critica os artistas que levantaram plaquinhas em Cannes por nunca se
manifestarem sobre o caos na saúde (sendo que esse mesmo crítico jamais cobrou
os médicos por não tomarem as ruas para reivindicar, por exemplo, cinemas e teatros
nas periferias).
Cultura
também É saúde, criatura. Não faltam pesquisas listando as vantagens das
atividades culturais para o corpo e a mente. Uma recente, na Inglaterra, mostra
que pessoas que vão a pelo menos um museu por ano têm uma chance quase 60%
maior de afirmar que são saudáveis. Outro estudo revela que participar de aulas
de dança regularmente é um ótimo jeito de eliminar quilos extras e prevenir
doenças cardiovasculares, o que reduz a demanda por leitos hospitalares.
E
de que adianta tanto livro, filme, peça, concerto ou exposição se não há
escolas decentes para ensinar o povo a apreciá-los?
Educação
não acontece só na sala de aula, filhote. Um cidadão em contato com diversas
manifestações artísticas desde os gugudadás já está sendo educado, e certamente
chegará ao ensino formal mais bem preparado. Não resta dúvida de que a criança
imersa num ambiente culturalmente rico – abraçada por toda forma de poesia
ainda no berço – terá muito mais facilidade de absorver e até mesmo questionar
os conteúdos que lhe serão apresentados pelos professores.
Outro
dia, saiu uma notícia de que células tumorais expostas à “Quinta sinfonia” de
Beethoven diminuíram ou morreram. Pois então: abdicar da cultura, sob qualquer pretexto,
em qualquer época ou lugar, é como interromper a melodia e deixar a sociedade vulnerável
ao mais perigoso tipo de câncer – aquele cujos principais sintomas são a
ignorância, o preconceito, o ódio.
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