Enquanto
recebe a visita de um velho amigo, que vem de longe para se despedir, sujeito à
beira da morte procura uma nova família para o seu cão.
Uma
sinopse dessas e o filme ainda abre a narrativa com uma rua coberta de neve e inverno
– a estação que comumente relacionamos ao fim da vida. Mas a iminência do
último dia é apenas pretexto para Truman
fazer uma viagem ao território da amizade. Logo nas primeiras linhas, o roteiro
de Cesc Gay (que também dirige o longa) e Tomàs Aragay toma um avião até um
lugar de cores menos frias, a cidade de Madri.
É
lá que conhecemos Julián, ator de meia-idade que desiste de médicos e hospitais
depois de meses lutando sem sucesso contra uma doença. Interpretado por um artista
consciente de que a tela grande ressalta até os menores gestos – o genial
Ricardo Darín –, o personagem diz sempre o máximo com o mínimo, como no
instante em que se mostra constrangido ao ver o amigo Tomás (Javier Cámara) se
referir, na frente de sua prima Paula (Dolores Fonzi), a certo episódio de
incontinência urinária.
Cámara
e Fonzi têm a mesma consciência do colega de set. É profundamente sugestivo um breve olhar
que Tomás lança sobre Paula, quando os dois estão assistindo à peça que Julián
estrela, ainda no começo da projeção. É repleta de nuances – tristeza, espanto,
admiração – a expressão da moça na cena do aeroporto, nos minutos finais, quando Julián surpreende o irmão camarada com um presente.
Tais
sutilezas preenchem com perfeição as entrelinhas deixadas pelos roteiristas. Exemplo
disso é a passagem em que Julián encontra Tomás e Paula no saguão do hotel e,
ao encará-los, pronuncia apenas um “Faz sentido”. Desnecessário explicar ao
espectador atento o que e por que faz sentido, uma vez que ele
certamente recolheu as pistas espalhadas até ali e, portanto, compreendeu a
atitude dos personagens.
Outro
mérito do texto escrito por Gay e Aragay é o equilíbrio entre drama e humor, o
que contribui para que a trama jamais lembre um velório e, ao mesmo tempo, situações
engraçadas nunca sejam vistas como mero alívio cômico. Nesse sentido, é bem ilustrativa
a sequência em Julián e Tomás visitam uma funerária e um atencioso funcionário
lhes apresenta os planos oferecidos pela empresa: os mais caros incluem DVD com
fotos a serem exibidas durante o funeral, quarteto tocando música clássica e
urna de porcelana para guardar as cinzas (no caso de cremação).
Em
meio àquele portfólio de absurdos, Julián pergunta se seus restos mortais caberiam
num recipiente tão pequeno – e a resposta afirmativa do atendente dá ao sujeito
a noção do quão insignificante ele é.
Entremeado
por essas e outras epifanias do dia a dia – como a que ocorre após o encontro
casual entre o ator e um suposto desafeto num restaurante –, o longa talvez
ache sua síntese na conversa em que Julián (às vezes excessivamente espaçoso)
revela a Tomás (sempre disposto a entender e realizar os desejos do amigo) o
que aprendeu com ele depois de tantos anos de convivência: que não se deve
pedir nada em troca àqueles de quem realmente gostamos.
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