Me
lembro bem de que, nas últimas eleições para presidente, uma conhecida defendeu
seu voto em Aécio Neves com o argumento (?!) de que, ao vencer o pleito, o
senador mineiro teria a oportunidade de cumprir o mandato que o avô dele,
Tancredo, não conseguiu nem iniciar porque morreu na véspera da posse.
O
sangue comove mesmo o brasileiro. Não é à toa que teste de paternidade e reencontro
de parentes ao som de trilha cafona ainda fazem tanto sucesso na tevê.
Até
me surpreendi com a cara feia da tal opinião pública quando o prefeito Marcelo
Crivella tentou colocar o Marcelinho como secretário da Casa Civil carioca. Onde
se enxergou tanto nepotismo, não era possível apertar os olhos e enxergar um
pai ajudando o filho a superar o drama do desemprego? Uma tremenda injustiça o
Supremo ter suspendido a nomeação – o mesmo Supremo que não viu problema quando
o gato de estimação do vice golpista (o Angorá) ganhou ministério e foro
privilegiado.
Que
tribunal é esse que ampara os bichos e desampara os homens?
E
não estamos falando de quaisquer homens, mas de brasileiros que servem a pátria
há inúmeras gerações. Veja os Magalhães na Bahia, que, se não me engano, licitaram
a lavagem inaugural das escadarias do Bonfim para receber a comitiva de Cabral,
recém-chegada de Lisboa. Veja também os Bornhausen em Santa Catarina, que, se a
memória não me trai, organizaram a primeira chopada de que se tem notícia em
Blumenau, e que inspiraria, décadas mais tarde, a criação da Oktoberfest.
Veja
ainda os Marinho no Rio, que, se não me falha o Google, usaram a voz bíblica de
Cid Moreira para anunciar ao país inteiro que reinava o paraíso sob o regime
militar.
De
norte a sul, esses e outros (pouquíssimos) clãs regem as vidas de milhões de
súditos há mais tempo que Pedro I e Pedro II juntos.
O
recorde absoluto, entretanto, pertence à dinastia de José Bonifácio de Andrada
e Silva, que ficou conhecido como “patriarca da Independência”. Ela não larga a
Coroa desde o período colonial e conta, até hoje, com um representante na Câmara
dos Deputados, o tucano Bonifácio de Andrada, no décimo mandato consecutivo.
Merecia ou não – porque aposentadoria é para os fracos – o Troféu Reforma da
Previdência?
Que
os vira-latas de plantão escutem o que vou dizer: nossa república dos bananas é
monarquia na veia, de causar inveja à rainha da Inglaterra – Elizabeth II pode
até não precisar pagar couvert artístico quando Paul McCartney ou Elton John
tocam em suas festas de aniversário, mas também não tem um décimo do poder da
realeza canarinha.
Nem
a longevidade.
A
casta que conduz a nação deve permanecer no trono por muitos e muitos anos, se
depender da plebe e da nobreza. Um estudo da Universidade de Brasília (UnB)
mostra que a bancada dos parentes na Câmara dos Deputados cresceu nas últimas
eleições. Atualmente, os herdeiros ocupam metade das cadeiras. TODOS os
parlamentares do Rio Grande do Norte, por exemplo, são familiares de políticos.
É ou não é de obstruir as artérias ver tantos laços sanguíneos preservados?
A
tradicional família brasileira resiste.
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