Um
dos raros momentos em que o protagonista de Moonlight
(Chiron) parece à vontade consigo mesmo e com o mundo é na aula de dança, na
escola. Diante de um espelho enorme – e, aparentemente, nem aí para as crianças
que dividem a sala com ele –, o menino sacode o corpo como se o ar (e a vida)
não oferecesse resistência.
Negro,
pobre, gay, criado apenas pela mãe (que se droga e se prostitui) no subúrbio de
Miami, o jovem – interpretado por Alex R. Hibbert na infância, Ashton Sanders
na adolescência e Trevante Rhodes na fase adulta – tem uma extensa lista de
motivos para se sentir marginalizado e se esconder numa casa escura e
abandonada ao fugir dos colegas que o perseguem, no começo do filme.
É
particularmente bonita (pois metafórica) a cena em que ele é resgatado de lá
por aquele que virá a ser o pai que nunca teve: Juan surge arrancando o tapume
de uma das janelas, permitindo assim que o sol finalmente incida sobre Chiron.
É como se o personagem vivido por Mahershala Ali desse à luz o pequeno – “batizado”
mais tarde no mar pelo mesmo Juan em outra cena lindíssima, igualmente inundada
de significado.
Uma
e outra sequências são marcadas ainda pelo silêncio do garoto, traço tão
ensurdecedor de sua personalidade, que atravessa todo o longa. Sua dificuldade
em verbalizar os sentimentos vai do instante em que é acolhido por Juan e
resiste a falar (até o próprio nome), passa pelo episódio em que apanha de um
amigo e atinge o ápice no último ato, quando hesita ao máximo em revelar a
certo personagem o quanto este foi (e ainda é) importante para ele.
Tais
silêncios ecoam a delicadeza do roteiro e da direção de Barry Jenkins, que
jamais se rende aos acordes tentadores do melodrama. Não por acaso o cineasta
usa uma simples frase para informar ao espectador que fim levou Juan,
dispensando dessa maneira uma cena que, nas mãos de um diretor menos sutil,
elevaria os decibéis de glicose a níveis estridentes. Da mesma forma, em outra passagem
capital da trajetória de Chiron, o mar e a mão que roçam a areia são
suficientes para que a plateia escute o alvoroço de sensações experimentado
pelo protagonista.
Numa
época em que parece ganhar atenção apenas quem fala mais alto (pouco importando
o que é falado), traz certo alívio ver um filme como esse – que sussurra o
grito de tantos excluídos – vencer um prêmio tão barulhento quanto o Oscar, ainda
mais quando o superultramegafavorito da noite é um musical, talvez o gênero que
mais berre sua natureza de faz de conta.
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