Agora
não é mais uma mulher que berra ao topar com um fantasma. É um homem que berra
– e se borra – ao fazer contato com uma criatura do outro mundo.
Traduzido
no país do ministério só-de-machos como Caça-fantasmas
(embora o original contasse com o artigo masculino), o novo Ghostbusters não inverte os sinais apenas
em sua sequência inicial; ao apostar num quarteto feminino para envergar as
célebres mochilas de prótons, vai ao além, digo, vai além – e se estabelece como
uma obra sensível a um tema relevante de sua época: a igualdade de gênero.
Reconheço
ter ficado ligeiramente decepcionado com o reboot, quando soube que Bill
Murray, Dan Aykroyd e Ernie Hudson não reprisariam seus papéis como Peter
Venkman, Raymond Stantz e Winston Zeddmore, respectivamente. No entanto, após vê-lo, entendi a decisão: a presença deles interpretando os antigos
personagens acabaria forçando os roteiristas a tratá-los como mentores ou
inspiração das garotas.
E
tudo que AS caça-fantasmas não quer é
cair no clichê das mocinhas que, na hora do pesadelo, precisam de uns marmanjos
para ajudá-las.
Uma
das qualidades do longa dirigido por Paul Feig é justamente incorporar as
reações histéricas daqueles seres que, ao descobrirem que a versão nova seria
protagonizada por quatro mulheres, passaram a fazer a linda blair e revirar os
próprios pescoços. Vide a cena em que Erin (Kristen Wiig) lê comentários sobre
um vídeo no Youtube e um deles diz que “vadia nenhuma vai caçar fantasmas”.
Mas
o filme não se restringe ao exorcismo dessas almas penadas – que ainda não
fizeram a passagem para um plano superior na escala de evolução.
Entre
suas virtudes, está o timing cômico do elenco. Kristen Wiig, Melissa McCarthy e
Chris Hemsworth são tão precisos, que até piadinhas bobas como a que menciona o
bichinho de estimação de Kevin (Hemsworth) arrancam risadas. Igualmente
expressiva, Leslie Jones se destaca mesmo nas menores falas: “Ok, sala cheia de
pesadelos...”, sussurra Patty com seus botões ao dar de cara com um monte de
manequins.
Uma
das atrizes, porém, assombra as expectativas. É Kate McKinnon. As passagens em
que Holtzmann dança “Rhythm of the night” ou quebra uma guitarra ou se diverte
experimentando (e assustando de) chapéu e peruca são só algumas em meio a
tantas nas quais ela surge possuída pelo demônio da insanidade – o que me
lembrou a performance arriscada mas bem-sucedida de Johnny Depp como Jack
Sparrow, o pirata em cujas veias corria rum.
Eu
adoraria me espantar com (muitas) aparições de McKinnon na próxima temporada de
prêmios.
Tão
divertidas quanto as manifestações de sua personagem são as referências aos Ghostbusters originais. Estão lá a eterna
canção de Ray Parker Jr. – que baixa em vários momentos –, o famoso logo – que
a montagem reverentemente esconde até os últimos segundos da cena que envolve
um jovem grafiteiro – e outras citações menos óbvias, como Erin afirmando que
“livros não podem voar e bebês também não”.
Já
as meninas podem, se quiserem; podem voar para longe daquela encruzilhada
onde só lhes restava ser princesas e esperar um príncipe para alcançar a
felicidade. Num filme como As caça-fantasmas, mulheres não são mais receptáculo de velhos estereótipos,
nem chamam ninguém: são ELAS as chamadas. Contando totalmente umas com as
outras, pegam as chaves de seu Ecto 1 e vão à luta.
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