domingo, 10 de maio de 2015

Janelas

Que é esse bebê de nariz arregalado, dobrinhas pelo corpo inteiro e bochechas altamente trucidáveis, sensualizando asseio à beira de uma banheira de plástico? Sorte minha não ter nascido com o gene do autocanibalismo. Caso contrário, teria me devorado todinho já nos primeiros meses e não estaria aqui para listar tanta fofice.
 
E o que dizer desse projeto de adulto prestes a subir no ônibus escolar? Expressão quase tão séria quanto a do Cid Moreira noticiando a implantação do cruzado novo, uniforme quase tão impecável quanto a Raquel de Vale tudo e cabelos quase tão alinhados quanto os de uma legítima peruca Lady.

Viro a página e dou de nariz – sempre arregalado – com um Batman customizado para enfrentar menos o Pinguim, mais o verão carioca. Tinha morcego no peito, tinha máscara preta, tinha capa esvoaçante? Tinha. Mas tinha também shortinho duas mãos acima do joelho, regata cavada até as batcostelas e um par de havaianas.

Olha essa festa, superprodução: bolo em forma de Maraca, lembrancinhas com os escudos do Vasco, do Fogo, do Flu e até do Fla (mimo para os primos que vinham de longe), brigadeiro e cajuzinho capazes de adoçar rivalidades e transformar todas as torcidas numa só. Viu o balão recheado de bombons para estourar depois do parabéns?

Menos recheado que aquela árvore de Natal. Um pinheiro de galhos magrinhos, é verdade, mas de deixar balofos de ansiedade os corações daqueles dois irmãos. Já chegou a hora de abrir os presentes? Detalhe nos embrulhos, aparentemente feitos pelos duendes mais competentes de todo o Polo Norte.

Dessa não me lembrava: eu no computador terminando a monografia. Um descabelo só. Mas dá um zoom na estante lá no fundo. Você nunca verá livros mais arrumados.

O dia do casamento. Na igreja. No altar. Fiquei quasímodo nesse close. Olhos tortos de tão marejados. Não sei como o fotógrafo conseguiu me pegar. Sujeito craque. Eu tremia tanto que não sabia o que era gravata, o que era garganta. Só reconhecia o nó – um oferecimento carinhoso da dona Angela, que eu tinha acabado de abraçar.

Impossível abrir um álbum da família e não enxergar minha mãe em cada fotografia, mesmo – ou especialmente – naquelas em que ela não aparece.

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