Hoje
vota o amigo que não discute política porque é inútil. Também vota o tio que
não abre a boca de urna porque não ganha um centavo pra isso. Vota ainda a madame
que não liga pro fato de o Brasil ter deixado o mapa mundial da fome; o que a
preocupa realmente, e a faz clamar por mudanças já, é a inflação dos últimos
meses, que elevou a níveis indigestos o preço do brie na Lidador.
Fico
me perguntando, com direito a réplica e tréplica, a quem interessa esse papo-zumbi
de que discutir política – algo que nos afeta diretamente – não leva a lugar
algum. Talvez interesse a quem lucra dividendos no Ibope; a quem capitaliza os mortos-vivos
que desperdiçam o horário nobre de suas vidas analisando que candidato a Tarcisão
tem mais chances de ser eleito no coração da Glorinha.
Quem
não lucra, não capitaliza, não tira um bolsa-família nem de meio debate entre
odoricos e paraguaçus é o tio. Por isso ele não se mete em propaganda gratuita.
Aliás, não se mete em nada que não renda ao menos uma comissão (a cervejinha
ele dispensa, já que é evangélico praticante). Em outras bravatas: o tio só
sobe no palanque para discursar seus entretantos e finalmentes se rolar aquele mensalinho
básico.
Bem
diferente da madame, que gosta tanto de subir – no salto – que o faz até de
graça. Desde, claro, que o calçado seja Chanel ou Louis Vuitton, de preferência
garimpado num outlet em Miami. Pois é ela vestir seus pezinhos de Cinderela da
Barra da Tijuca que começa a protestar: especialmente contra o fato de ter que
dividir a fila do check-in no aeroporto com a própria empregada.
Não
bastasse receber vale-transporte, hora extra e décimo terceiro, agora ela quer
viajar de avião – e sentar na janela. Vê se pode.
Pode.
Yes, they can. Podem tanto quanto o amigo que só quer saber de novela: das
seis, das sete, das nove, do Viva. Podem tanto quanto o tio que só quer saber
de cachê: não importa de que propinoduto ele venha. Podem tanto quanto a madame
que só quer saber do próprio umbigo, recauchutado em doze vezes: onde talvez só
caiba o condomínio de classe média no qual sobrevive a duras plumas.
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