1)
É. Não resisti. Mas o leitor não se preocupe, que não vou submetê-lo a
confissões do tipo “Já fiz a coreografia de ‘Ilariê’, da Xuxa, em frente a uma
centena de pessoas”. Resolvi compartilhar verdades incomparavelmente mais relevantes
que essa – e infinitamente mais constrangedoras para qualquer um que tente
desmenti-las. Vamos a elas.
2)
Uma reforma da Previdência que faz a aposentadoria virar um sonho mais distante
do que casar com a Beyoncé (ou o George Clooney) e dar a festa num iate à beira
do Mediterrâneo não quer de fato salvar a Previdência. Logo o sujeito vai se
dar conta de que é melhor não entrar no sistema (e continuar na informalidade)
do que começar a pagar por um benefício de que mal usufruirá. Talvez ele até
contrate uma previdência privada e faça a alegria de Marcelo Caetano – secretário
da Previdência, um dos idealizadores da reforma e membro do conselho de
administração da Brasilprev, empresa de previdência privada – ou o gáudio de
Arthur Maia – que é relator da reforma na Câmara dos Deputados e recebeu duas
doações da Bradesco Vida e Previdência nas eleições de 2014, totalizando 299
mil e 972 reais.
3)
Não é a CLT ou a Justiça do Trabalho que dificultam a geração de empregos, como
querem nos fazer crer os defensores da reforma trabalhista, cujo objetivo maior
é autorizar que o negociado entre patrões e empregados prevaleça sobre as leis
vigentes. Se fosse assim, não teríamos experimentado – há míseros três anos –
taxas de desemprego que não chegavam a 5%; a CLT e a Justiça do Trabalho estavam
no mesmo lugar e não impediam as contratações. O que impossibilita a criação de
vagas é a falta de demanda. E a demanda só vai desfaltar quando o povo tiver
dinheiro no bolso novamente – o que nos leva à próxima verdade.
4)
A terceirização sem restrições do mercado de trabalho (inclusive das chamadas
atividades-fim, isto é, os professores numa escola ou os médicos num hospital) apenas
diminui o poder aquisitivo da população. Vários estudos sobre o tema mostram
que os funcionários terceirizados ganham, em média, 24% menos que os formais,
mesmo trabalhando, em média, três horas a mais. Como é possível uma economia voltar
a crescer se as pessoas empobrecem e limitam seu consumo?
5)
O patrão não passa a contratar mais porque o empregado custa menos. Caso a fila
do Méquidônis não espiche – e a procura por mais hambúrgueres não o pressione a
admitir mais cozinheiros e atendentes –, ele vai tão somente embolsar o
dinheiro a mais, fruto dos encargos trabalhistas a menos. Se não fosse desse
jeito, grandes empresas teriam investido os recursos de inúmeras isenções
fiscais na contratação de mão de obra. Como o consumo não crescia, optaram sabiamente
por guardar a grana extra e aumentar o lucro. Os governos (federal e estaduais),
por sua vez, perderam a receita desses impostos, o que agravou a crise fiscal.
6)
É muitíssimo injusto exigir que a conta dessa crise seja paga pelos mais
vulneráveis. Em vez de fechar Farmácias Populares, sucatear universidades, mexer
na aposentadoria de quem vive no campo ou retirar direitos de assalariados que
ganham dois ou três mínimos, um governo comprometido com quem o elegeu (e não
com quem o patrocinou) proporia uma reforma tributária que taxasse fortunas e
cobrasse impostos sobre lucros e dividendos; uma reforma que incidisse mais
sobre o patrimônio, menos sobre o consumo. É indispensável aumentar a receita? Claro,
mas não (só) à custa dos pobres e da classe média. É fundamental, enfim, transformar
o dinheiro arrecadado em investimentos (que geram empregos) e amparo social a
quem mais precisa.
7)
Não há dúvida de que alcançamos tamanha instabilidade política graças (também)
à corrupção. Mas paremos com essa história com agá minúsculo de que ela (a
corrupção) começou ontem, ou de que é o maior esquema de todos os tempos do mundo
judaico-cristão-ocidental (e top três se incluirmos o resto da Via Láctea).
Cinco minutos de Google e você descobre que a corrupção é mais antiga nesta
terra do que os versos de Gregório de Matos sobre o assunto; que o flerte entre
empreiteiras e políticos vem de quando Brasília não passava de um pesadelo na
cachola do Niemeyer; que a lua de mel entre elas e eles aconteceu no regime
militar, período em que delação não diminuía a quantidade de anos na cadeia,
mas a de choques elétricos e afogamentos no porão. O grupo que assumiu o poder
em 2003 apenas renovou – o que não o exime de responsabilidade, é óbvio – os
contratos senhoriais assinados aqui há gerações.
8)
Ilusão acreditar que a solução para nossos problemas esteja fora da democracia
ou da política. Se o candidato a qualquer cargo público se referir à ditadura
verde-oliva como época em que unicórnios alados sobrevoavam plantações de marshmallows
coloridos, basta reler o item sete para tirar os cavalinhos dessa chuva
lisérgica. Já se o candidato afirmar que não é político, pode descartá-lo
também – porque já mentiu antes mesmo de prometer congelar o preço da passagem.
Está lá no Houaiss: político é quem “exerce ou luta por ter influência
administrativa em níveis federal, estadual, municipal”. Portanto, a criatura pode
ter sido a vida inteira CEO de quermesses para empresários. Virou candidato a
prefeito, senador, presidente? É político, sim. Nem adianta se disfarçar de
gari ou jardineiro – que a política salta ainda mais aos olhos quando em
contato com a demagogia.
9)
Foi (e a cada dia é mais) golpe.
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