Definição
melhor não há para Divertida mente:
filme cabeça. Não bastasse ter como cenário
principal o cérebro de uma menina de onze anos (Riley) e como protagonistas as
emoções que lá habitam – Alegria, Medo, Nojinho, Raiva e Tristeza –, o novo longa
da Pixar ainda apresenta um conjunto tão vasto de boas ideias, que ofuscaria
até uma viagem à cachola de Freud guiada por Charlie Kaufman.
Que neurônio não sorri diante daquelas criaturinhas aspirando
e descartando as lembranças mais antigas? Que não gargalha toda vez que certo
jingle é repetido? Que não pega carona no trem do pensamento? Que não se
encanta com as ilhas que sustentam a personalidade de Riley e que, com a
passagem da infância para a adolescência, desmoronam e precisam ser reconstruídas?
Quantas sinapses não são feitas quando três personagens
invadem a sala do pensamento abstrato e sofrem uma espécie de picassoalização
das suas formas (numa sequência que brinca com a própria natureza da animação)?
Quantas zonas da massa cinzenta não são reativadas quando certa criatura
assustadora – que repousava nos confins do inconsciente – precisa ser acordada?
Quantos neurotransmissores não são produzidos quando somos levados ao lugar
onde os sonhos são fabricados – algo como uma Hollywood intracraniana?
Mesmo que se resumisse a esses conceitos – todos tão bem
resolvidos visualmente, que em geral prescindem de grandes explicações para que
sejam entendidos (vide as memórias, representadas pelas esferas coloridas) –, Divertida mente já seria um filmaço. Mas
não. Ele vai muitíssimo além de um desfile de alegorias digno de nota dez em
originalidade.
Numa época em que não compartilhar selfies de felicidade
absoluta a cada segundo é indício de câncer emocional em processo de metástase,
um filme que trata a Tristeza com tezão, conferindo-lhe status de personagem
indispensável à vida de qualquer ser humano, merece toda a atenção e reverência.
É um insight de ousadia e coragem em meio a tanto déjà-vu nas telonas.
Em ritmo de aventura (o que entretém os ainda miúdos), o
roteiro mostra ao espectador e à Alegria – habituada a afastar a Tristeza do
painel de comando – que não amadurecemos apenas com sorrisos: lágrimas são mais
do que necessárias para que possamos pavimentar novas estradas dentro de nós
mesmos e erguer pontes mais seguras entre nossas emoções e o mundo.
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