Aquele
pão com manteiga estatelado no piso que a patroa tinha acabado varrer não podia
dar em boa coisa. Era sinal amarelo demais. Ainda assim, Seu Aparecido insistiu
em sair de casa para ir ao banco retirar a raquítica aposentadoria – prêmio de consolação
por séculos de serviços prestados aos ternos e paletós daquela cidade. Não
havia sujeito bem vestido na região, a começar por prefeitos e vereadores, que
não tivesse passado pelas agulhas e tesouras do alfaiate.
Só que isso não vem ao caso. Nem sei por que estou falando essas coisas. Afinal, o que
fez Seu Aparecido virar notícia no país inteiro não foi seu talento com roupas
e afins. Ao contrário. Muito ao contrário. Aliás, quem presenciou a cena ao
vivo e em cores garante que foi tão ao contrário quanto uma cueca samba-canção
– das favoritas do nosso herói – vestida do avesso. Vejamos então.
Mas
com as devidas tarjas pretas – para não ferirmos olhos e suscetibilidades.
Como
todo início de mês, Seu Aparecido se dirigiu à agência bancária de sempre para
sacar seus tostões. Antes, porém, de atravessar a temível porta giratória (estrela
dos seus, dos meus, dos nossos pesadelos mais claustrofóbicos) e embrenhar-se
no banco, descansou celular e chaves numa conchinha de vidro, sob os narizes
farejantes dos seguranças. Bom dia, rapazes – e lá foi ele.
Não,
não foi. A bicha-papuda travou.
Culpa
de umas moedinhas que esquecera no bolso da camisa. Aqui estão, rapazes – e lá
foi ele de novo. Não, não foi. A bicha permanecia tão parada a Avenida Brasil
na hora do rush. Ah, as fivelas dos sapatos. Aqui estão, rapazes – e lá foi ele
outra vez. Não, não foi. A bicha insistia em sua greve. O cinto, claro. Aqui
está, rapazes – e lá foi ele ainda cheio de esperança. Não, não foi. Bicha filha
de uma...
Enquanto
Seu Aparecido ia perdendo as estribeiras e peças do elegante figurino, os
seguranças, do outro lado da porta, se desfaziam em mímicas para tentar
acalmá-lo. Por que não destravaram logo a dita-cuja e permitiram sua entrada – afinal,
ele era cliente daquele banco desde mil novecentos e dercy gonçalves – é
mistério que só um exame detalhado em seus respectivos córtices cerebrais poderá
desvendar.
Para
deixar tudo mais tenso, uma fila de clientes e curiosos foi se formando atrás
do nosso personagem. Que tirou o terno, a camisa, as meias, a calça. Sobrou até
para a peruca. Não adiantou nada. A bicha nem se mexia. Continuava tão travada
quanto meu Internet Explorer. Beijinho no ombro – ela diria se falasse. A essa
altura, já se ouviam gritos a favor de um striptease completo, vaias contra o
capitalismo judaico-cristão ocidental e a sirene da polícia.
Seu
Aparecido não segurou o rojão. Mas resolveu mostrá-lo. Incorporou o go-go boy e
arrancou, com requintes de vandalismo, o último adereço que o distinguia dos
astros da G. Aqui está, rapazes – e
lá foi ele. Sim, ele foi. Ele finalmente foi. Só que direto para o camburão.
Estava preso por gravíssimo atentado. Ao pudor? Quis saber uma senhorinha de
guarda-chuva em riste, aparentemente indignada com a atitude dos policiais.
Fabio, bom dia! Como gostei desta! e como odeio aquela porta giratória que sempre trava apesar do meu medo de que isto aconteça....rs..... Abraço,
ResponderExcluirMto bom! Huahuahua...
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