Se
as últimas delações serviram para alguma coisa até agora, foi pôr fim à lenda
urbana e rural de que a Friboi é do filho do Lula. Ficou claro que quem manda
no país, digo, na companhia é a dupla Joesley e Wesley – assim como ficou claro
que o sertanejo nutella, vulgo “universitário”, envenenou os ouvidos brasileiros
de tal modo que eles passaram a acreditar em todo tipo de lorotas, até nas que
não são contadas no Jornal Nacional.
Outro
mito derrubado é o de que bilionários se fazem apenas com trabalho duro e despertador
programado para tocar às cinco. Calma, friboizetes: ninguém duvida de que os
irmãos Batista tenham seus méritos. Ninguém duvida de que tenham se
empenhado em estudar o mercado e buscar oportunidades de lucro. Ninguém duvida de
que trocaram inúmeras noites em suas camas quentinhas por madrugadas no
frigorífico para se tornarem donos da maior produtora de carne do planeta.
Ao
mesmo tempo, porém, não dá para duvidar de que os manos só acumularam tantos
bilhões graças ao auxílio generoso do Estado brasileiro. O BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) emprestou milhões à JBS para
que adquirisse concorrentes, incrementasse sua expansão internacional e se tornasse
a multinacional que é hoje. Se não fosse esse Carne Sem Fronteiras, nem
saberíamos quem são Joesley e Wesley – ainda estaríamos falando de Maiara e
Maraísa.
O
noticiário da semana contou e recontou esse case
de sucesso do capitalismo de compadrio – aquele em que o êxito do negócio depende
das estreitas relações entre empresários que financiam campanhas eleitorais e
políticos que legislam a favor de seus patrocinadores – como se estivesse
diante da última picanha do churrasco; quase como se essa fosse uma prática
inventada pelos governos petistas e materializada por Temer no já célebre
encontro com Joesley no Jaburu, em que o ex-deputado Eduardo Cunha
aparentemente era (tem gosto pra tudo) o prato principal.
Chega
a ser um deboche uma das empresas que mais se beneficiaram da intimidade com o Estado
para se tornar a número um em seu ramo no Brasil (e a número dois ou três no
mundo) criticar quaisquer relações nebulosas entre iniciativa privada e poder
público. Quem foi além do sumário nos livros de História sabe que a Globo apoiou
o regime militar a ponto de, no dia seguinte ao golpe, em 2 de abril de 1964,
celebrar em seu diário de papel o restabelecimento da... democracia. A lua de
mel entre Marinhos e milicos se estendeu por tanto tempo que, oito anos depois,
o então presidente Emílio Garrastazu Médici afirmou que se sentia feliz ao ver no
telejornal apresentado por Cid Moreira que “o mundo estava um caos, mas o
Brasil estava em paz”.
É
óbvio que tanto plim-plim rendeu muito dindim: que veio na forma da instalação
de um sistema nacional de torres de televisão bancada pelo governo; da
associação entre a emissora carioca e emissoras espalhadas pelo país, muitas
delas pertencentes a políticos locais aliados dos militares; de linhas de
crédito para qualquer cidadão comprar um aparelho de tevê sem juros. Até um
concorrente poderoso – a TV Excelsior, cujo proprietário apoiava abertamente o
presidente João Goulart, deposto pelas Forças Armadas – passou a sofrer
retaliações financeiras e fechou as portas.
Era
a chuva de arroz perfeita: de um lado, os generais querendo uma rede de comunicação
que atingisse o país inteiro e ajudasse a livrá-lo da “ameaça comunista” (também
conhecida como “todo pensamento que estimulasse desejo de justiça social”); de
outro, um grupo empresarial disposto a fazer os acordos que fossem necessários
para alcançar o topo da cadeia alimentar.
Qualquer
semelhança com as tenebrosas alianças entre agentes públicos e privados flagradas
recentemente não é mera coincidência.
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