Era
uma reprise do Marília Gabriela
entrevista, o programa dela no GNT: Charles Möeller e Claudio Botelho – os mágicos (de Oz?) responsáveis por grande parte dos musicais que têm lotado nossos teatros nos últimos anos – falando da carreira, da vida, da frase, verso, palavra favorita, coisa e tal.
Conversa
vai, conversa vem, arregalei os ouvidos quando escutei que ensaiavam apenas
oito semanas – nem um ato a mais – até a estreia das peças. Como assim “oito
semanas”? Dois mesezinhos e o Herson Capri vira o Capitão Von Trapp? o José
Mayer canta e dança feito um judeu? um bando de jovens estreantes cresce os
cabelos e viaja até a Era de Aquário?
Quem
assistiu às montagens de A noviça rebelde,
Um violinista no telhado e Hair (entre outros) sabe: os caras fazem
misérias, digo, riquezas no palco. Suas peças são o que há de mais Broadway
fora da Broadway. Cenários, figurinos, coreografias, atores/cantores, as
versões em português das músicas – nada é menos do que ótimo.
Tudo
funciona com precisão. E são só oito semaninhas de preparação com o elenco. De
oito a dez horas por dia. De segunda a sábado. “O nome disso é
profissionalismo. Temos que pagar todos os envolvidos desde o primeiro minuto.
Por isso não podemos nos dar ao luxo de ficar meses e meses ensaiando”, um
deles disse algo mais ou menos assim.
Enquanto
eu devaneava algo mais ou menos assim: Charles Möeller e Claudio Botelho, chefes
do comitê organizador da Copa e das Olimpíadas. Quatro anos – nem um
Pan-Americano a mais – para levantar estádios e ginásios sem estourar
orçamentos, modernizar aeroportos sem esticar prazos, ampliar a rede hoteleira
sem construir puxadinhos, despoluir lagoas e baías sem jogar sujeira pra
debaixo do tapete.
Ou,
melhor, Charles Möeller e Claudio Botelho, prefeitos da minha cidade,
governadores do meu estado. Um mandato – nem uma reeleição a mais – para
desengarrafar o trânsito, desobstruir as artérias dos hospitais, alfabetizar todos os alunos, diminuir os índices de
criminalidade, urbanizar as favelas, transformar moradores de rua em cidadãos.
Sonho
(distante) de uma crônica de verão? Talvez. Afinal, ainda estamos no outono. Mas
quem sabe com um pouco do tal profissionalismo, com respeito ao dinheiro alheio
– nosso no caso – e trabalhando de oito a dez horas por dia, de segunda a
sábado, a dupla não conseguisse o que tantos tentam (tentam mesmo?) e não
conseguem: mudar a realidade.
Alguém
na plateia dirá que estou misturando ópera com chanchada. Pode ser. Pode ser
que, mesmo após a queda da cortina na gestão Möeller-Botelho, não saíssemos por
aí cantando na chuva, dançando no meio da feira, na fila do banco ou no vagão
do metrô – como acontece nos musicais –, mas, quero acreditar, não viveríamos mais
neste país do futuro que insiste em não vestir o figurino do presente, do
ensaio que não acaba quando toca o terceiro sinal, do faz de conta que não
chega nunca ao final feliz.