Fernanda e eu saímos da sessão de Amor
com os corações calados. Levou um tempo pra ela (ou eu, não lembro) dizer o
óbvio: que a Emmanuelle Riva não pode perder o Oscar de melhor atriz pra
Jennifer Lawrence, a bonitinha mas ordinária do bonitinho mas ordinário O lado bom da vida.
Como de costume, procuramos um café após o cinema. Depois de uns dez
minutos examinando o menu, escolhemos o mesmo sanduíche, apenas com pães
diferentes: ela, o australiano; eu, a baguete. Ela ainda pediu um chai, e eu,
uma média. Nada especial. O bonitinho mas ordinário de sempre. O lado bom da
vida.
Até um casal de idosos (bem idosos) sentar na mesa ao lado: ele quase
de frente pra mim; ela quase de frente pra Fernanda. Não precisaram do
cardápio. Foram direto no pão na chapa, no expresso e no bolo de cenoura com
cobertura de chocolate. Dois garfos, por favor.
Achei esse Lincoln o filme
mais cacete da história, ela resmungou. Já estava ficando abafada com tanto
gabinete, político e a Sally Field à beira de um ataque de nervos. Não sei por
que o presidente não fez aprovarem uma lei que a abolisse da Casa Branca. Ele
foi um herói mesmo; merecia estar na nota de cem dólares, não na de cinco.
Gostei do Day-Lewis. O peso de ser o homem mais poderoso do mundo
estava na expressão cansada, na voz cansada, no corpo cansado. Que ator.
Prefiro o Jean Valjean, dos Miseráveis.
Daria todos os prêmios pra ele.
Boba. Está dizendo isso só pra me provocar. Pensa que eu não sei? Te
conheço há cinquenta anos, esqueceu? Os
miseráveis é musical bom de ouvir, mas de ver... Muitos closes. Aliás, o
diretor não tirava a câmera do rosto dos atores um segundo. Estava ficando
abafado com tantos poros e olhares sofridos.
Fernanda e eu mal conseguíamos cuspir um monossílabo. Continuamos
quietos, só escutando. Os pães, os expressos e o bolo chegaram.
Meu favorito é o Pi. Só acho
uma pena não terem indicado o tigre, o velho lembrou. E o moço que filmou a
história do Irã, dos americanos fugindo. Pelo menos o careca gente boa, o avô
da Miss Sunshine, o que fez o produtor de Hollywood que ajudou a CIA, ele
foi... Adoro aquele sujeito!
Pra mim, o melhor de todos é o Django.
Delícia acompanhar aquele crioulo metido a branco explodindo com casa-grande e
tudo no final. Há séculos não sentia tanto prazer.
Um gole de silêncio.
No cinema, querido; no cinema.
Também gostei do Jan-go – com
“d” mudo, ele continuou (com ar de alívio). Ainda que eu prefira o outro do
Tarantino, o Kill, Kill... Aquele em que a menina põe fogo
no Hitler e nos outros nazistas dentro do cinema. E o herói marca o vilão com
uma suástica na testa. Obra-prima, obra-prima.
Fim da sessão e do lanche. Pagaram a conta e se levantaram. Ele primeiro – pra
puxar a cadeira e ajudá-la a ficar de pé. Ela beijou sua mão e os dois deixaram
o bistrô de braços dados. Logo se perderam na multidão que lotava os corredores
do shopping naquele sábado à tarde.
Fernanda e eu permanecemos em silêncio por mais um tempo, não lembro
quanto, mastigando o resto do sanduíche, bebendo o resto da xícara, saboreando o
resto da cena – digna de todos os Oscars – a que havíamos acabado de assistir.
eu quero ver todos esses filmes
ResponderExcluirÓtimas dicas hein ;D gostei!
ResponderExcluirwww.kiwizero.com
Amour é um filme dilacerante, fiquei extremamente mal. Haneke é um dos meus diretores preferidos, tem um estilo cru e real. Preciso ver Lincoln e Django ainda.
ResponderExcluir