Boa pista para saber que páginas temos escrito, que autores e
personagens temos sido. A hora é redondinha para pensar nisso. Pelo menos no nosso caso. Amanhã completamos um ano de casamento. Exatos 366 dias (2012 é
bissexto) de um romance surpreendente a cada capítulo.
Pois eu desconfiava à-becíssima da minha capacidade e disposição de
assumir as responsabilidades de um cotidiano sem papai e mamãe ao alcance dos
dedos. Sem as regalias do hotel mil estrelas que a casa deles era. (Que ainda
é, e agora mais, porque passei a ser hóspede recebido com honrarias de chefe de
Estado. O hotel virou resort.)
Você não desconfiava. Parecia ter certeza – desde os primórdios do
namoro – de que eu estava apto à vida a dois. De que eu dava sinais claros de
vir a ser o marido que vai à rua sob chuva comprar o remédio para o seu
resfriado; que troca a roupa de cama e lava a louça do almoço; que poupa religiosamente
uns trocados para viagens a castelos e outros destinos encantados; que encara
uma pista de dança a noite inteira sem reclamar do sapato; que escuta suas
angústias, raivas, tristezas e etcéteras com beijitos nas bochechas.
Que enfrenta com diligência, bravura – e aspirador a tiracolo – qualquer
barata cascudamente repugnante de até dois centímetros.
Ah, a recíproca é verdadeiríssima. Em todos os quês. O que me dá uma
certeza também: de que temos escrito páginas de uma história produtiva e feliz; de
que temos sido bons autores e personagens – a melhor versão de nós mesmos.
Só não tenho sido o sujeito – uma goleada de perdões – que ignora
futebol, mesas-redondas e demais acréscimos. Mas aí já seria pedir o marido perfeito, né? Seria aceitar a existência de duendes e fadas. Seria acreditar em candidato-carochinha
às vésperas de eleição. Seria levar a sério os versos do Roberto. E esse cara –
avesso a maracanices – definitivamente não
sou eu. Acho que jamais seria.